Educação e diversidade
- gabrielledantas1
- 21 de jul de 2024
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Cultura: um Conceito Antropológico Plural
Introdução
A disciplina de educação e diversidade toma como premissa o conceito de cultura pertencente ao conjunto de perspectivas antropológicas que partem do entendimento de que nós, seres humanos, vivemos em uma sociedade plural e diversa. A educação está diretamente relacionada à cultura e às diversas possibilidades com que se realiza nas diferentes sociedades.
Assim, nessa perspectiva, devemos reconhecer as diferenças culturais como fundamento da diversidade com que a vida social se realiza. Perceber as diferenças humanas como algo normal, nada mais é do que o contínuo exercício de visar o bem viver em sociedade.
Concepção Antropológica de Cultura
Partindo da concepção antropológica do conceito de cultura para a compreensão da diversidade e da educação, ou seja, daquelas correntes signatárias da ideia de que o ser humano é um ser cultural, e que, portanto, convive social e culturalmente com outros povos. Para os propósitos desses estudos, devemos renunciar à concepção de cultura no senso comum, ao menos daquelas abordagens que compreendem a cultura como um termo classificatório de indivíduos e grupos sociais inteiros, de forma generalizante e/ou até mesmo preconceituosa. Em educação e diversidade, leva-se em consideração as culturas, no plural, bem como as diversas possibilidades com que a educação se realiza.
Definição de Cultura na Antropologia
Uma das características do ser humano é a sua capacidade cultural, e isso o distingue de outros seres vivos. Nesse sentido, podemos afirmar que todos os seres humanos produzem cultura, seja vivenciando o cotidiano da vida, seja representando a realidade em que se inserem. Na antropologia, sabemos que existem muitas definições e correntes teórico-metodológicas em torno do conceito de cultura. Visando contemplar os propósitos desta disciplina, podemos definir, de modo geral, o conceito de cultura como a capacidade da humanidade como um todo e a cada um dos povos, nações, sociedades e grupos, de se apropriar dos recursos naturais e transformá-los, de conceber a realidade e expressá-la (Santos, 1994).
A cultura, vista sob esse ângulo, caracteriza-se como a possibilidade do indivíduo, inserido em seu agrupamento social, de viver o seu dia a dia, compreender a realidade e atribuir significados a ela, planejar, calcular e transformar a natureza, além de refletir sobre todas as coisas que estão ao nosso redor.
A abordagem antropológica é uma das maneiras de definir cultura a partir de um conjunto de pressupostos metodológicos e regras determinados por essa ciência.
A Origem e Desenvolvimento da Antropologia
A antropologia, portanto, é uma ciência que se dedica ao estudo aprofundado do ser humano e suas relações. É um termo de origem grega, formado por *anthropos* (homem, ser humano) e *logos* (conhecimento). Sendo uma das ciências sociais, a antropologia nasceu e se desenvolveu ao longo do século XIX, tendo o objetivo de estudar e conhecer a cultura e a diversidade das manifestações culturais dos diferentes povos no tempo e no espaço.
Multiculturalismo, Etnocentrismo e Relativismo Cultural
Multiculturalismo
Ao longo da história e desenvolvimento da antropologia, há diferentes abordagens em relação ao entendimento do conceito de cultura, que varia de acordo com a perspectiva metodológica adotada. Evolucionismo social, relativismo cultural, funcionalismo, estruturalismo, entre outras, são exemplos de algumas das correntes da antropologia. Para os propósitos desses estudos em educação e diversidade, as noções relacionadas ao conceito de cultura serão realizadas a partir das diferentes perspectivas: multiculturalismo, etnocentrismo e relativismo.
O multiculturalismo parte da premissa da existência de sociedades multiculturais, ou seja, de que diferentes culturas coexistem no interior de um mesmo espaço social (Brasil), e suas relações podem se dar por aceitação, podendo ser até híbridos quanto à inclusão do outro na condução política e econômica de uma determinada sociedade; de tolerância, como o próprio termo define, ou seja, quando as culturas se toleram em uma mesma sociedade, mesmo que os interesses da cultura dominante prevaleça, mas sem que ocorra a aceitação; ou de conflitos, quando se percebem manifestações de diversas formas de violência, por meio de ações preconceituosas e/ou discriminatórias praticadas por indivíduos e grupos.
Multiculturalismo é um termo que indica a existência de muitas culturas em uma determinada sociedade. O Brasil, por exemplo, é um país multicultural, o que se evidencia claramente quando refletimos sobre as particularidades de nossa formação social, política e econômica, marcadas pela inclusão de diversas etnias e culturas ao longo da história, e pelo estabelecimento de relações culturais com os povos originários e autóctones aqui estabelecidos. O contato entre os diferentes povos caracteriza-se por relações de dominação e de exploração.
Etnocentrismo
O etnocentrismo parte da ideia, do ponto de vista de quem observa, em considerar a sua própria etnia no centro de tudo, ou seja, é a base (conjunto de princípios e valores) pela qual o observador deve olhar as demais culturas existentes no mundo. Nesse sentido, a própria etnia (povo) e todos os atributos culturais que lhes são peculiares devem estar no centro de referência do sujeito observador, especialmente quando se relaciona a culturas diferentes. Trata-se de um instrumento comparativo de diferentes culturas.
Na antropologia, o etnocentrismo está presente nas narrativas da evolução, denominadas evolucionismo social. O inglês Edward Tylor, o norte-americano Lewis Morgan e o escocês James Frazer são autores que apoiam suas teorias nas narrativas de evolução.
Essas perspectivas são, portanto, etnocêntricas, pois entendem que a cultura dos povos “civilizados” dos quais fazem parte, incluindo seus modelos de desenvolvimento, correspondem à etapa mais evoluída da humanidade, além de ser tomada como centro de referência nas comparações entre as diferentes culturas.
A perspectiva etnocêntrica foi responsável por proporcionar formações sociais desiguais desde o advento da modernidade. A “postura” etnocêntrica foi a base para o colonialismo, contribuindo com o desenvolvimento do mercantilismo e da economia de mercado, além do avanço do imperialismo e do fenômeno do neocolonialismo, pelo qual diversos países da África, Ásia e Oceania foram dominados pelas potências imperialistas que se desenvolviam no contexto da Segunda Revolução Industrial, tendo suas riquezas exploradas e expropriadas.
As teorias do evolucionismo social serviam de “justificativa” para a dominação exercida pelos europeus no contexto do imperialismo. O encontro entre os europeus e as diferentes populações não europeias resultou no fenômeno do etnocentrismo. Uma postura etnocêntrica, portanto, possibilita um entendimento equivocado e preconceituoso do outro, uma vez que não se reconhece a diferença e todas as dimensões culturais.
Relativismo Cultural
Em perspectiva inversa ao evolucionismo, o relativismo cultural toma como referência a ideia de que cada cultura deve ser analisada a partir dos seus próprios termos. Os olhares, as observações e todas as possibilidades de percepções de uma cultura diferente devem ser relativas. Esse exame depende fundamentalmente da forma com que o indivíduo e seu grupo compreendem e enxergam as diferentes culturas do mundo ao seu redor.
O antropólogo alemão Franz Boas foi quem inaugurou a perspectiva do relativismo cultural e, ao criticar a postura etnocêntrica do evolucionismo cultural, compreendia o conceito de cultura semelhante a um todo integrado e ordenado em determinado agrupamento social, movido a partir de princípios vivenciados e compartilhados pelos indivíduos de uma sociedade específica.
Enfim, como você pode perceber, existem diferentes concepções em torno do conceito de cultura, a partir de uma abordagem socioantropológica e das relações com a educação.
Expressões, Práticas, Crenças, Valores, Tradições e Costumes
As bases do conceito de cultura que estamos adotando nos estudos sobre a sociedade, a educação e a diversidade, tomam como referência o reconhecimento da própria diversidade cultural humana como fator indispensável nesse exercício reflexivo. Expressões, práticas, crenças, valores, tradições e costumes são formas de representações culturais da realidade praticadas por diferentes etnias e culturas ao longo do tempo e do espaço.
A educação, mecanismo pelo qual a assimilação das práticas culturais é possível, corresponde a um processo de socialização dos indivíduos, assumindo um papel importante para a vida em sociedade.
O sociólogo francês Émile Durkheim aponta a educação (e a escola) como uma das instituições sociais responsáveis por “moldar” os indivíduos para a vida em sociedade, de acordo com os pressupostos estabelecidos pela consciência coletiva de determinada sociedade.
Como podemos perceber, a educação serve para a socialização das pessoas, pois ela reflete o papel social que cada indivíduo deve representar naquela sociedade, sendo que, assim, todos aprendem que para serem adultos, alguns para se tornarem homens, mulheres ou mesmo para se tornarem chefes, feiticeiros, músicos, de acordo com a posição que vão ocupar no grupo (Previtelli; Vieira, 2017). Segundo a perspectiva de Durkheim, a educação, assim como outras instituições sociais, promove a coesão social. Para o sociólogo, a sociedade prevalece e se impõe sobre os indivíduos, a fim de integrá-los à sociedade.
As diversas práticas e representações culturais dos indivíduos e grupos sociais coexistem com os diversos tipos de educação: educação informal, educação formal, educação não formal e educação popular para se tornarem chefes, feiticeiros, músicos, de acordo com a posição que vão ocupar no grupo (Previtelli; Vieira, 2017).
Segundo a perspectiva de Durkheim, a educação, assim como outras instituições sociais, proFemove a coesão social. Para o sociólogo, a sociedade prevalece e se impõe sobre os indivíduos, a fim de integrá-los à sociedade.
As diversas práticas e representações culturais dos indivíduos e grupos sociais coexistem com os diversos tipos de educação: educação informal, educação formal, educação não formal e educação popular – destacando que as suas diferenças estão diretamente relacionadas à forma e ao local onde se realizam os processos educativos. A educação informal, por exemplo, é aquela que se realiza de maneira espontânea e cotidiana em diferentes espaços e tempos, geralmente no espaço familiar e na convivência social em comunidade.
É o resultado de experiências acumuladas, adquiridas e praticadas no dia a dia.
Já a educação formal é aquela que ocorre no ambiente escolar, regulamentada e sistematizada pelo Estado.

Trata-se de uma modalidade formal, pois é uma prática regular e obrigatória, pois todos os indivíduos devem ser educados e, assim, preparados para a vida em sociedade.

A educação não formal é mais ampla e acontece fora da escola, mas não é espontânea como a informal, pois é intencional, direcionada e programada. É o caso da educação realizada em movimentos sociais, ONGs, instituições religiosas, culturais, etc. E a educação popular é a que resulta da valorização da cultura popular, geralmente desenvolvida por iniciativas políticas e sociais e de movimentos de base.
Perspectiva de Clifford Geertz
O conceito de cultura, para a antropologia, visa o reconhecimento e a valorização da diversidade das práticas culturais humanas.
Para Clifford Geertz, antropólogo contemporâneo, a cultura corresponde à teia de significados tecidos pelos próprios seres humanos, e a função da antropologia é descrever a multiplicidade de expressões culturais a partir da sua interpretação. O conceito de cultura em Geertz se assemelha a um texto que deve ser interpretado.
Para ele, cultura são padrões de significados transmitidos de maneira histórica, por meio de símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas de forma simbólica, através da qual a comunicação e o desenvolvimento do conhecimento sobre a vida e suas atitudes se realizam.
Geertz define a cultura como um sistema de significação, ou seja, um conjunto de símbolos e significados representativos e, para tanto, adota a ideia da descrição densa das práticas culturais, interpretadas por quem vive o cotidiano de um grupo específico e que representam formas de comunicação sobre o que os indivíduos imaginam de si mesmos e dos outros.
Escrito por Gabrielle Dantas e Revisado por Jefferson Firmino, em 21 de Julho de 2024.





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